quarta-feira, 29 de setembro de 2010

as flores secas- Roberto Torrance

um relógio constante e cruel, uma escuridão óbvia, homens mulheres meninos e meninas rodeando na imensidão desse corredor finito, que se inicia colorido e agora está pálido, de resto, o corredor é desconhecido, tem uma lâmpada pendente rodando devagar, e nesse trecho existe no centro um algo com que de bizarro, próximo de um fantasma, ou de um exemplo, não se sabe ao certo, este algo recita com voz firme, hora de voz chorosa um poema:

das flores tenho olhos apenas para espinhos,
e desse tão belo nada que já tanto foi vivido
és agora o muito vagar morrendo sozinho,
e junto com muitos aqueles que vem,
as vezes até por um tanto admirar
projetando o fantasma que querem amar,
que com rasas esperanças acabem por secar.
nunca mais verdes das flores secas e cantais das flores tristes, agora que esse monstro percebeu que em algo se tornou, e em outro algo se figurou.
http://mlksabbath.blogspot.com/

domingo, 26 de setembro de 2010

fisiodesculturismo- Rolando Vezzoni

se há o certo, é o equilíbrio.

vê-se já todo o tal corpo,
físico, valorizado, supervalorizado.
agora esse tão relevante é paradoxalmente irrelevante,
pelo tanto que desacreditado, desvalorizado pelo outro extremo é.
ainda porque, de todo belo preconceituoso, tem um não belo insultuoso,
levado a crer que o extremo pesado do ponto é o burro, tonto, e cegado portanto é,
além de tudo que se possa entender, de extremos muito pouco se lê e se eleva, tudo balanceado.

pesa-se errado, irreleva-se o preconceituoso e o invejoso, o fisioculturista tanto quanto o fisiodesculturista.

sábado, 25 de setembro de 2010

a vida é uma merda que devemos perfumar da melhor maneira possível- Rolando Vezzoni

nobre o homem procura ser,
no meio do tampo do raso,
por cegueira ele enxerga ,
o que tanto houve de haver.
mesmo tanto porque,
ainda que não houvesse esse todo e tal porque.

infeliz sempre vê-se,
e esta paz que se deseja,
já não apenas distante como impossível,
ainda pela moral almeja-se,
pois homem esse ainda garoto, não escolheu, encolheu.

nunca serás invisível e não só por pura aversão do não visto,
nem tampouco apenas por um suposto escárnio desse.
não tens o nulo com aptidão.

nem procura a felicidade,
sendo essa a tal da estupidez,
tenha como certo e como claro,
que o feliz é ao menos um pouco levado a não ver,
e não penses que ver é puramente pontual, é de todo intelectual.

domingo, 19 de setembro de 2010

... - Lígia Fernandes

E mesmo que não estivesse sóbrio,
que arrotasse informações indevidas,
continuava na garganta aquele nó górdio.


Passaram-se vidas e velórios...
E fora tanto tempo corrido...
Falava de tudo.
Menos o que lhe era devido.
Luto.


Ela ainda espera
- pobre,
o que não dissera
aquele homem de porre.

quinta-feira, 16 de setembro de 2010

pro debaixo do meu tapete... - Lígia Fernandes

Preguiça, falta de vontade e qualidade; porém movida a dinheiro. Não é um trabalho sujo o da moça diarista; sujo é o estado que fica meu apartamento. Digo, superficialmente, tudo parece muito organizado. No entanto, basta olhar entre as frestas, debaixo dos tapetes. Tudo, toda a realidade, a maior nojeira embaixo do meu tapete.
Pego uma vassoura e uma pá, mas os filhos da mãe voltam no próximo dia e, ainda por cima, parece que se reproduzem em escala bestial! E a moça não se importa, na verdade, nem me ouve. Tapada. Ignorante. Alienada.
Enquanto finjo supervisionar seu trabalho, tomo um café olhando através da janela. A situação pede um cigarro. Acendo-o. Criaturas de ternos e semelhantes, andando e chutando e pisando em garrafas, copos e sacolas. Hora ou outra chutavam as criaturas jogadas e dormindo nas calçadas.
Aquilo tudo parecia tão normal... Ninguém se importando; é uma cidade escondida debaixo de um tapete gigante.